2020-04-02 17:35:00
<p><img title="Entrevista - COVID-19 - Ilustração: Freepik.com" src="http://www.apcefrs.org.br/web/upload/misc/image/ad37419e5cea377e66490a0d97195596.jpg" alt="Entrevista - COVID-19 - Ilustração: Freepik.com" width="660" height="660" /></p>
<p>Em entrevista exclusiva realizada por telefone para o Jornal João de Barro, da APCEF/RS, o infectologista do Serviço de Controle de Infecção da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre e professor de Medicina da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), Claudio Stadnik, explica as peculiaridades do Novo Coronavírus e alerta para a importância do isolamento social neste momento da pandemia.<br /><br /><strong>João de Barro - Uma das teorias que tem circulado especialmente nas redes sociais digitais é de que a COVID-19 seria menos letal que outras enfermidades. Então, por que há tanta preocupação com relação ao Novo Coronavírus?</strong><br /><br />Claudio Stadnik - Na verdade, o Novo Coronavírus só é menos mortal se comparado a outros Coronavírus de antes. Quando comparado com o vírus de gripe, que é o Influenza, por exemplo, o Novo Coronavírus é, sim, mais letal. A gente não sabe exatamente quanto mais letal por um grande problema: não testamos todo mundo. E, provavelmente, tem muitos sintomáticos leves por aí que não sabemos, nem saberemos. Mas, pelo o que a gente está vendo, essa mortalidade é de, pelo menos, duas a seis vezes maior do que o Influenza. Ao mesmo tempo, ele é tão contagioso ou mais do que o vírus da gripe. E com um agravante: o vírus da gripe, quando começa a se espalhar pelo mundo, encontra várias pessoas já imunes. Seja por uma imunidade natural - porque já pegaram o vírus antes -, seja por uma imunidade artificial - por causa da vacina. Então, quando o vírus da gripe chega, ele não consegue pegar todo mundo. O Novo Coronavírus é diferente. Ninguém tem, teoricamente, imunidade contra ele. Então, ele acaba tendo uma grande possibilidade de infectar um grande número de pessoas. E, como a contagiosidade é grande e rápida, acontece que muitas pessoas podem pegar ao mesmo tempo ou em pouco tempo. Então, a nossa grande preocupação em relação ao Novo Coronavírus não é só o fato de que ele tem uma mortalidade maior, mas também o fato de que ele pode deixar muita gente doente ao mesmo tempo, sobrecarregar o serviço de saúde e, assim, a gente não conseguir atender adequadamente todo mundo. Isso é o que está acontecendo na Itália, na Espanha e em algumas cidades como Nova Iorque, por exemplo. Então, são essas questões que nos preocupam muito.<br /><br /><strong>JB - Qual a diferença do Novo Coronavírus para ou outros Coronas que já haviam sido registrados anteriormente? </strong><br /><br />CS – Este Novo Coronavírus sofreu uma mutação, facilitando enormemente a capacidade de transmissão entre humanos. Os outros até eram mais mortais, mas não conseguiam se transmitir facilmente de uma pessoa para outra. Este deixou de lado um pouco sua agressividade para investir mais na sua transmissibilidade.<br /><br /><strong>JB – A pneumologista da Fiocruz, Margareth Dalcolmo, disse que as subnotificações dificultam combate à COVID-19 no Brasil. O senhor endossa essa teoria?</strong><br /><br />CS - Mas é claro. A quantidade de produção de teste foi suplantada. Não se consegue produzir tantos testes para todo mundo. Ninguém estava preparado para isso. E, a partir do momento em que a gente não testa todo mundo, o que acontece? Há uma subdetecção, principalmente de casos leves.<br /><br /><strong>JB - Mas estaria havendo mortes não detectadas?</strong><br /><br />CS - Provavelmente, não. A não-detecção provavelmente é dos casos leves, que não internam. Nos que internam, o hospital consegue fazer os testes. <br /><br /><strong>JB - Quais são os principais sintomas do Novo Coronavírus? Todos(as) que apresentam sintomas devem procurar unidades de saúde?</strong><br /><br />CS - Os sintomas imitam uma síndrome gripal. Normalmente, com febre, mal-estar, cansaço e sintomas respiratórios, como nariz entupido, uma dor de garganta, tosse seca etc. O grande problema é que nem todo mundo vai ter todos estes sintomas. Algumas pessoas podem ter só nariz escorrendo e uma dor de garganta, sem febre, sem mal-estar, sem cansaço. Outras pessoas podem ter um pouco mais de cansaço. Talvez simplesmente nariz escorrendo e, mesmo assim, vai ser Coronavírus. A gente sabe que 85% das pessoas que pegarem vão ser pouco sintomáticos ou assintomáticos. <br /><br />As pessoas não devem sair correndo para procurar médico. Enquanto a pessoa estiver sem sintomas de gravidade, não deve procurar o serviço de saúde. Até porque a gente não tem testes suficientes também. Então, a pessoa só vai trazer riscos para os outros e para si mesma se sair de casa. Fique em casa, beba bastante líquido, fique em repouso e espere se recuperar. Se passar a ser uma suspeita, fique quatorze dias em isolamento. <br /><br />Quando a gente precisa se preocupar e ir para o serviço de saúde? O principal fator é falta de ar, diminuição do fôlego. Começa a notar que não consegue fazer coisas que antes conseguia fazer, como subir uma escada? Ali é o momento de procurar uma emergência, uma UPA, para ser visto por algum médico.<br /><br /><strong>JB – Quais são os grupos de risco?</strong><br /><br />CS – As pessoas que têm alguma doença concomitante correm mais risco de ter uma evolução ruim do vírus: pessoas com problemas respiratórios, doença pulmonar obstrutiva crônica, enfisema, bronquite, asmas graves. Outras questões, como cardiopatias, doenças relacionadas às válvulas cardíacas, insuficiência cardíaca, hipertensão, diabetes mellitus e imunossuprimidos por qualquer causa - seja por doença ou seja por medicamentos. E, claro, pessoas de idade avançada, acima de 60, acima de 65 anos.<br /><br /><strong>JB – O Brasil registrou o primeiro caso do Novo Coronavírus no dia 26 de fevereiro. Passado pouco mais de um mês, estamos com quase cinco mil casos e mais de 200 mortes. O País está preparado para enfrentar essa pandemia?</strong><br /><br />CS – Temos que avaliar a seguinte questão: estão chegando cada vez mais testes. Então, daqui a pouco, a gente vai poder testar mais, que é o que a gente quer. Se a gente está preparado, é difícil responder esta pergunta no momento exato, de acordo com a dinâmica da epidemia. Uma coisa que a gente tem que lembrar é que nós estamos com uma vantagem: nós estamos nos preparando e temos tempo de nos prepararmos ainda melhor. A gente está abrindo mais leitos, está conseguindo mais respiradores, importando materiais EPIs para proteção. Ou seja, cada dia que passa, cada dia que a gente consegue atrasar um pouco o número de casos, a gente vai estar mais preparado. Quanto mais a gente empurrar para frente, mais preparados nós vamos estar. Então, do ponto de vista de estrutura, é claro que nós tínhamos uma estrutura bastante limítrofe. Mas, com certeza, nós estamos melhores hoje do que na semana passada, do que no mês passado.<br /><br /><strong>JB - Autoridades mundiais da área da saúde têm insistido na importância de “achatar a curva” de propagação do Novo Coronavírus. O que significa isso?</strong><br /><br />CS - Achatar a curva significa empurrar a epidemia mais para frente. E aí as pessoas podem pensar “puxa, mas é ruim empurrar mais para frente, vai ter igual”. Não, não é ruim, não é a mesma coisa. Como eu disse, a cada semana, a gente vai estar mais preparado. Então, é muito importante que a gente não tenha um pico enorme agora, todo mundo pegando o vírus ao mesmo tempo, nesta próxima semana, por exemplo. O importante é achatar essa curva e empurrar para que as pessoas vão pegando ao longo dos meses, para que nos dê tempo de nos prepararmos melhor para o atendimento, com mais vagas de UTI, respiradores etc. Então, teoricamente, essa é uma vantagem nossa, do Brasil, com relação ao resto do mundo, onde o pico chegou antes e eles foram pegos bastante desprevenidos. A gente está tendo tempo de se preparar. Então, achatar a curva significa salvar vidas, com certeza.<br /><br /><strong>JB - De que forma que os governos, as empresas e a sociedade podem contribuir para achatar a curva?</strong><br /><br />CS - A primeira questão é ter a consciência da gravidade da situação. Ou seja, esta não é uma “gripezinha” ou um “resfriadinho”. É uma doença grave, com alta mortalidade, embora baixa no percentual, mas alta nos números, que é o que a gente está vendo no mundo. Por quê? Porque ela vai atingir uma grande parte da população. Então, o número de pessoas com gravidade vai ser muito grande porque o número de pessoas infectadas vai ser muito grande. Então, entender esta gravidade, entender que o momento é crítico, que nós nunca enfrentamos uma situação deste tipo, por vários motivos, é um primeiro passo. <br /><br />O segundo passo é saber que empurrar a curva mais para frente é extremamente importante. E por isso que o timing, o tempo de tomar as medidas, é importante. Não adianta a gente começar a agir no meio do caos. O momento é agora, em que a disseminação é relativamente pequena. Depois, a gente pode rediscutir como vamos voltar às atividades, como vamos retomar a economia, como vamos retomar os trabalhos, os empregos. Mas agora, este primeiro momento é impactante. Qualquer isolamento, qualquer distanciamento social, neste momento, é de grandíssima ajuda.<br /><br /><strong>JB - A partir da experiência de outros países que já estão com o número de casos decrescendo, é possível prever quanto tempo o Brasil levará para superar a crise do Novo Coronavírus?</strong><br /><br />CS - Quem souber a resposta exata para esta pergunta ganha o prêmio Nobel. Na verdade, a gente não tem uma perspectiva de data. O que a gente tem visto, através da experiência de outros países, é de que leve em torno de dois meses. Mas quem vai dizer quanto tempo isso pode levar aqui no Brasil? A nossa preocupação é de quanto tempo vai levar o pico, para que a gente administre os recursos de saúde que a gente tem. Mesmo que a curva seja achatada e até dure um pouco mais de tempo da epidemia, pode ser até melhor, porque aí a gente consegue atender todo mundo. Então, o importante talvez não seja o tempo total, mas quanto tempo essas medidas intensivas vão funcionar. <br /><br /><strong>JB - O senhor gostaria de deixar alguma mais mensagem para os(as) nossos(as) leitores(as)?</strong><br /><br />CS - Fiquem em casa.</p>
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